Há cinco anos atrás tentei
ler uma obra, que mesmo sem conseguir chegar ao final, mudou a minha vida:
"A paixão segundo G.H" de Clarice Lispector. Na época não sabia compreender
o porque desta sensação, muito menos o por que de no prefácio do livro, Clarice
advertir "Este livro é como um livro qualquer. Mas eu ficaria contente se
fosse lido apenas por pessoas de alma já formada". Na época, a obra me
perturbou tanto que serviu como matéria prima para uma peça da qual me orgulho
muito chamada "Outros modos de Sentir".
Apesar deste contato com o
imaginário da autora, sentia que não compreendia totalmente a agonia da personagem GH. Tentei recomeçar
diversas vezes o livro e sempre me senti a margem do que ela sentia, por vezes me
soava pesado e chegar ao final do livro me parecia distante, pois era muita
informação a ser processada. Segui insistindo, pois mesmo sem saber porque, ela
mexia comigo e queria desvendá-la, mas a minha incompreensão de mim, me impedia.
Assim, após algumas exaustas tentativas, o coloquei na minha estante de livros
a serem lidos, uma ala de meu quarto que só aumentava.
Nos últimos meses fui
tomado por uma sede incansável de respostas para tudo, e finalmente aquela ala
de obras que eu não compreendia me fizeram a companhia necessária num período
de comunhão comigo mesmo. Era o momento exato de conversar com ela, e hoje GH
me é tão próxima, que não senti mais peso ao lê-la, ao contrário, ela me passou
tanta compreensão, que me deixou mais leves as mazelas. Compreendi a diferença entre livros de bolso, que são lidos e passados de mão em mão sem nada dizerem, e de autênticas obras, que mesmo de difícil compreensão, quando tentamos desbravá-las, sentimos necessidade de modificar a nós mesmos, lutando contra nosso ego, nossa falsa sensação de auto-valor, que exacerba, cega e afasta a felicidade.
Ainda no prefácio, Clarice
adiciona que devem ler somente pessoas que "saibam que a aproximação, de
que quer que seja, se faz gradualmente e penosamente - atravessando inclusive o
oposto daquilo que se vai aproximar." Em outras palavras, negar a si mesmo
aquilo que o impulssiona a evoluir em detrimento de sua zona de conforto. Existem obras que surgem em nossas vidas
para ficar e outras que surgem só para nos fazer caminhar, na maioria das vezes
não teremos escolha, quando o mundo se colocar no
meio de nossos caminhos através de erros e falta de compreensão de nosso próprio caminhar, é preciso silenciar e ouvir a si mesmo, para enxergar que aqueles
impulsos o fizeram andar e sem perceber, realizar que você já chegou
a outro lugar. É nesta hora, que se deve pesar, o tanto de si que está pronto para vivênciar uma obra, ou se ainda é preciso matar mais tempo com livros de bolso.
Outros Modos de Sentir: https://vimeo.com/41981310